terça-feira, 2 de junho de 2009

macabéa revisitada

Mas quero escrever sobre a dentista que me atendeu hoje, uma mistura de Macabéa com Clarice, criatura e criadora assim juntas de uma forma um tanto peculiar. Eu preciso contar sobre essa mulher, sob o risco de não conseguir dormir. Eu sonhei com ela na noite anterior à consulta. E no sonho uma amiga me alertava sobre ela, dizia para eu ter cuidado. Eu acordei cabreira, mas fui ainda assim. Chegando no consultório, uma senhora de jaleco branco veio atender a porta em passos vagarosos. Tive dúvidas se era a própria dentista ou uma secretária flicts, quase uma mudança de cor, como a Macabéa. Deduzi que era a dentista. O mais interessante é que a sala dela, para mim, era a sala onde Macabéa trabalhava. Havia vasos de plantas e samambaias penduradas pelos cantos. Macabéa teria uma samambaia, eu sei disso porque ela me falou. Também havia um quadro de Jesus Cristo na parede e um móbile azul de furtivas lacrimas. A mesa onde ficam os instrumentos era também azul, aquele azul clarinho da geladeira que com certeza sua mãe também teve nos anos 70. E as indicações eram todas em ponteiro. A lâmpada também era algo retrô. É, a sala tinha um quê de Adeus, Lênin!. E eu deitada na cadeira sem conseguir tirar os olhos daquela mulher. Passeei por seus cabelos ralos, avermelhados. As mãos eram pontilhadas com as mesmas manchas que Macabéa teria caso a sua hora da estrela tivesse esperado um tanto mais para chegar. Um rosto de poucos movimentos, nenhuma maquiagem, as unhas bem cuidadas. Ela falava como a Clarice na entrevista à TV Cultura, o mesmo enrolar de língua que tornava as palavras todo um mundo possível. Ela me explicava sobre as formas de respirar melhor e eu a via falando, bem devagar, "é que eu escrevo simples". Me pus a imaginar seus pequenos prazeres. Comer cachorro-quente com coca-cola? Escutar a Rádio Relógio? Parafuso e prego? Escrever livros? Moldar próteses nas bocas alheias e guardá-las, milimetricamente organizadas no armário baixo? Eu acho que ela esconde um infinito de bocas naquele armário. Bocas que são também o que ela guarda das pessoas, antes que elas fujam, como eu fugi.

4 comentários:

b9 disse...

Aonde?Número do tel dessa dentista urgente!

Anônimo disse...

você viu um filme chamado "Mouchette", de robert Bresson?? É uma Macabéa. digo, um tipo de Macabéa - aquele tipo de anonimato que só a Clarice consegui transmitir a idéia..Veja o filme, se não viu, é impressionante! Não sei se sou seu parente, mas meu nome é Paulo Proença heheh

Anônimo disse...

Á dentista é ótima. Muito bacana! Estou following rs você no twitter (tem um boneco-cachorro do Banana Split como foto e meu nome lá é vervelle) bj!

Syma disse...

Hola Danyella,
yo tambien lei la Macabea de Clarice, pero me decepcionó un poco.
beijos

http://unsilencioprecario.blogspot.com.ar/2012/06/macabea-de-clarice.html

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