terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

don de fluir

Quando estamos guiados pelo Aberto, as coisas fluem com uma força impressionante: tudo parece mais genuíno, mais profundo.

No fim de semana, fui pega de surpresa pela confirmação de que poderia entrevistar, mesmo que por telefone, o diretor Luiz Fernando Carvalho, "objeto" (odeio essa palavra) da minha pesquisa de mestrado. Foi assim: recebi a resposta de que poderia entrevistá-lo no mesmo dia em que a entrevista deveria acontecer. Eu, caórdica como sempre, fiquei oscilando entre a euforia de algo não programado e o desespero por não poder controlar tudo: não tinha lido e relido e trilido todas as perguntas que gostaria de fazer, não tinha me preparado psicologicamente para o dia tão esperado, não tinha planejado o que diria - não tinha simplesmente feito nada de especial. 

Resolvi apostar no caos. Seria uma insensibilidade dispensar essa imagem nesse momento, logo ela que é tão central na minha dissertação. Ainda assim, comecei a conversa querendo controlar, estabelecer metodologias, regras para a nossa própria entrevista, que se daria em partes. Mas não fico frustada por isso, não. A passagem de um estado a outro nunca é tão rápida assim - estamos falando de uma vida em que lido constantemente com as polaridades entre controle e descontrole. Mas não é assim o universo? Devem ser ecos da minha porção do cosmos, eu e meus big bangs particulares.

A conversa foi ótima, como eu supunha, e esclareceu pontos importantes para a minha jornada (na academia e fora dela, porque as coisas nunca se separam, acredito).

De quebra, fui apresentada a essa lindeza aqui: Maya Plisetskaya em sua leitura de Carmen. Don de fluir...



quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

drexleando, pra poder seguir sin perder la ternura

sobre todo creo que no todo está perdido
tanta lágrima, tanta lágrima, y yo soy un vaso vacío

oigo una voz que me llama, casi un suspiro
- rema, rema, rema...!

creo que he visto una luz al otro lado del río.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

i scream, you scream, we all scream (not for ice cream)


A verdade é que eu estou descrente. Cansada e descrente. Desanimada, até. Cansada da falta de senso de alteridade das pessoas. Cansada de lidar com gente que projeta tudo no outro, despeja seus vazios, lança sobre você aquilo que não consegue olhar sobre si. No fim, é tudo um jogo de espelhos mesmo. E eu perdida entre reflexos. Estamos no mês de fevereiro de um ano que mal começou e eu estou diante de todos os meus maiores defeitos. É que, se me lançam frases ou acusações ou qualquer distorção, eu abraço. O outro diz: "é!". E eu penso: "será que sou?", e sigo ensimesmada pensando que sim, há sempre um ponto de razão na fala do outro, mesmo que seja a razão do outro. E a minha razão, quem vê?

Pensei em uma situação específica que me chateia, mas logo vieram outras coisas acumuladas. Estou cansada desse papel que assumi sabe-se lá quando e por que conveniência. Cansada de ser legal, doce, compreensiva, justa. Na minha tentativa de compreender a tudo e a todos, tantas vezes acabo traindo a mim mesma, meu desejo, meu grito. Lembro de uma imagem que deve ter me ocorrido em algum sonho, acordada ou não: eu, uma grande tartaruga de cascos firmes; sólida, constante, carregando nas costas outras tartarugas menores de outras consistências.

Eu poderia apenas balançar e literalmente jogar todo mundo para o alto. Mas eu carrego. Eu agüento. Essa é a mensagem que passo aos outros, sem nem perceber: ok, tudo bem, não estou confortável, mas eu agüento. Esse casco duro, constante e firme é uma herança familiar, traço de uma linhagem de mulheres que respiram fundo e dão mais um passo. Resistem. Talvez lá sob o sol do sertão de antigamente isso fizesse mais sentido. Hoje, me dói e é o instantâneo que as pessoas têm de mim. Minha polaroid.

Tudo isso era para dizer que eu estou cansada. Farta de ver meu mérito ser penalizad0 com mais tarefas ou vampirizações de todo o tipo. E o pior: farta de não conseguir gritar. Deve ser por isso que eu sonho tanto que grito e a minha voz não sai. Não, não é possessão, não é a velha pisadeira me sufocando o peito enquanto durmo, e quem conhece as crenças de interior sabe do que estou falando. É pura vida. Tenho um grito tão antigo, mas tão antigo, que deve vir de muito antes daquele papel de carta lindo e bem cuidado que troquei com a vizinha por um feio e amassado, só para não desagradar. Antes até do batom importado da minha mãe que emprestei para a coleguinha do colégio, tendo como garantia um batom 24h carcomido, daqueles verdes que ficavam vermelhos na boca. É claro que a menina nunca me devolveu o meu.

Também guardei um grito quando troquei minha Barbie nova por um patins sem freio, daqueles de calçar com tênis. Quando minha mãe me repreendeu pela troca, fui até a casa da vizinha desfazer o negócio. Não tinha ninguém em casa. Eu joguei o patins pelo buraquinho do portão. No dia seguinte, era só pegar minha Barbie. É lógico que isso não aconteceu. A menina disse que a Barbie estava na casa da avó dela, em Catalão (criança também sabe mentir), e que iria trazer de volta. Esse dia nunca chegou, até que eu desisti de cobrar. Ilustrei aqui momentos da primeira infância, mas o motor permaneceu em diversos momentos da minha vida.

Na adolescência até a faculdade, me especializei em fazer boa parte dos trabalhos de grupo praticamente sozinha. Ou então em praticamente refazer as partes que o povo mandava pela metade, de qualquer jeito. E entregava os trabalhos com o nome de todo mundo, mesmo que a maioria não tivesse feito quase nada. Mas tenho consciência de que minha atitude controladora reforçava a atitude vagal dos outros, e aí ficávamos diante de uma verdadeira relação viciosa.

A figura que melhor descreve como eu me sinto agora, pensando em tudo isso, é o velho Charlie Brown. Me lembro daquele episódio do Dia das Bruxas, em que todos os garotos ganham doces e Charlie ganha sempre uma pedra. Na fila, cada um diz: "ganhei uma bala!", "ganhei doces!", e Charlie Brown diz, com uma vozinha triste: "e eu, uma pedra...".

Não quero dizer aqui que me sinto uma loser, ou que as coisas sempre dão erradas comigo. Na verdade, eu sempre soube muito bem o que queria e sempre fui atrás do meu desejo, do que fizesse sentido para mim no momento. Sei bem qual é o meu papel nisso tudo, para compor o cenário que estou traçando aqui; a medida da minha culpa. O problema é que eu não sou do tipo que se sente à vontade pegando atalhos, correndo atrás de favores, chamando a atenção para mim e pedindo que se lembrem de mim na hora das recompensas. Sou péssima em marketing pessoal. E aí eu fico que nem o Charlie Brown, a última da fila, ganhando uma pedra em vez dos doces da festa.

Eu sempre espero que meu trabalho vá ser reconhecido por si só. Sim, o trabalho é reconhecido, ainda bem. Meu perfeccionismo obsessivo-compulsivo tinha que servir afinal para alguma coisa, além de me dar gastrite e insônia. Mas reconhecer nem sempre é igual a valorizar. Às vezes tenho vontade de virar uma profissional bem relax, daquelas que vão embora assim que dá o horário, que entregam as coisas como é possível, só fazem o que é pedido e olhe lá, e não esquentam a cabeça. Quem disse que eu consigo ser assim?

Bom, passeei aqui por um bocado de situações que estão me fazendo mal nos últimos tempos. Para além do desabafo, tudo isso foi mais uma autoanálise do que qualquer outra coisa. Aprendo a cada dia com minhas limitações, obsessões e afins. Tentar mudar algumas coisas na persona é bom, mas gritar ainda é a melhor purificação. Que venha!

18 dias no Japão

Foram 18 dias de sonho e muitas caminhadas pelo Japão. Começamos por Tokyo, onde ficamos por 4 dias. A ideia era entrarmos em contato com c...