quinta-feira, 13 de março de 2014

Querô


Não entendo de análise literária, mas Querô, do Plínio Marcos, tem uma estrutura super interessante. Fiquei pensando em termos de montagem cinematográfica não-linear o tempo todo.

Dá vontade de jogar a peça numa timeline do Premiere e ir montando os planos. Na verdade, Querô já vem montado numa ordem delírica. Nesse sentido, achei o texto mais radical que o outro que li dele, O Abajur Lilás.

Gosto também das imagens que Plínio Marcos nos apresenta nas rubricas. Por exemplo, quando descreve as personagens cercando Querô "num grande balé obsessor". Que imagem mais bela e forte! Quanto de vida cabe neste "balé"...!

Por fim, me arrebata o texto terminar com uma repetição da fala do Repórter. Pungente, em tempos de justiceiros:

"Era de tardezinha, quando os homens, com suas armas, encontraram o Querô. Mas já não era necessário despejarem o veneno de suas metralhadoras no corpo inanimado. Querô já estava caído pra sempre. Assim mesmo, despejaram ódios no pequeno bandido. E ele ficou lá caído para sempre. Ou caído até o dia em que, animado pela virilidade espiritual transformadora, ele e outros como ele se ergam das cinzas onde se sufocam, das chamas onde se ardem, das fomes onde se desesperam, dos cubículos onde são empilhados, espremidos, esmagados de corpo e alma, nos sórdidos recantos onde se degeneram e venham cobrar de nós, cidadãos contribuintes, as ofensas todas que em nome de nossos tesouros, de nossos privilégios, de nosso conforto, fizemos à dignidade humana".

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