terça-feira, 4 de março de 2008

para arlecchino - notas que o carnaval traz

São impressões tão antigas que encontro dificuldade pra dizer o que está dito a cada segundo pelos meus olhos: é que sempre fomos. Sempre fomos, meu amor, desde que dona Teté correu de Sítio dos Nunes para a Serra Talhada, sempre fomos. Desde que um pequeno delicado nasceu na terra dos matadores. Desde que você e sua mãe foram abraçados por Brasília, um abraço desajeitado, cheio de quinas e ossos, daqueles que espetam. Somos tão antigos quanto a poeira dessa cidade. Somos desde que um tal José veio de São Paulo para cá, e encontrou uma tal Maria. Desde que, traçados irônicos os dessa Brasília, vocês foram morar na quadra da minha avô emprestada, presente de madrinha. Desde que nunca nos vimos. Somos a mesma brincadeira tímida, o mesmo verão televisão-palavras. O mesmo medo de escuro, medo de ficar sozinho na escola depois que todas as crianças iam embora, medo de que o ar não nos molhasse os dedos à noite, quando elas dormiam tão quietas. O mesmo olhar encantado diante da chuva na janela. Até o choro de felicidade vem de um lugar muito parecido, a mesma fonte, aquela que nos torna pequenos diante de tantas belezas do mundo. Quem sabe você não caminhava pelos bosques de superquadra enquanto eu andava de moletom lilás pelas ruas do Guará, soprando flores até que ganhassem o céu? Ou então enquanto eu media o tamanho da minha sombra no asfalto? Quem sabe você também não se perguntou por que ela estava sempre lá, e era impossível fugir? Quem sabe não inventou uma receita com leite ninho e chocolate no liquidificador, pra parecer milkshake? Acho que inventamos tudo isso, sem saber que inventávamos nosso próprio encontro. Porque eu miro seus olhos e vejo todas as minhas velhas imagens, coisas tão antigas que não sei se são recordos ou registros de antes, da terra, de estrelas, essa matéria de que somos feitos.

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