quarta-feira, 25 de março de 2015

Filipe com "i" - o processo

Nota: este texto foi escrito em setembro, como parte do Diário da Saudade - cartas que eu escrevia para o João quando ele já estava nas Filipinas.



*Para ler ouvindo Você é Doida Demais, do Lindomar Castilho.






Amor meu,

Depois que você levantou a lebre de escrevermos o nome do nosso filhote com "i", não consegui mais me desligar disso. Toda a minha natureza obsessiva-compulsiva se manifestou com força total e eu não consegui tirar esse pensamento da cabeça. A cada momento do meu drama, eu me sentia uma personagem de um filme do Almodóvar ou então de um seriado desses bem doidos. Sério, amor. Eu sofri. Sofri simplesmente porque você me tirou da zona de conforto de algo que já estava decidido. Aí começou a via-crucis, um longo processo até eu me acostumar com a nova ideia.

A sensação era a de um cachorro correndo atrás do rabo. Passei esses dois dias escrevendo o nome do pequeno com "i" e com "e" para ver qual batia melhor. Escrevi nos bloquinhos, escrevi no computador, criei até um contato fictício na agenda do meu celular pra visualizar assim com mais realidade. Virei a doida dos nomes.

Pesquisei toda a História. Fui até a Macedônia e outros cantos que nem existem mais no mapa. Como você disse, a origem parece ser mesmo com "i". Até na Bíblia eu fui parar e lá estava: Filipe. Mas algo ainda me arranhava nessa grafia. Passei o dia incomodada, tentando compreender qual era a minha agonia. Por que algo tão banal estava me causando tanta angústia?

Eu escrevia no computador e ficava longos minutos olhando para o monitor. Já sei! É que a palavra pesa mais pra esquerda, sabe, um bloco visual concentrado num canto da palavra. Veja: Filipe. Tudo é vertical. Agora, com Felipe é diferente. Olha como é harmônico. Começa vertical, desce, depois sobre, depois desce. Duas letras "e" quase simétricas, meio que equilibrando a palavra. Fiz todo esse percurso de pensamento para me achar louca logo em seguida. Ainda bem que consigo rir de mim mesma. Palavra pesando mais para um lado? Chega de viagem alucinógena, Danyella, foca no fato histórico. Mas quem disse que eu conseguia?

Resolvi escrever à mão pra ver se passava. Percebi que eu ficava ligeiramente sem ar a cada vez que ia pingar o i. Eu devia estar chegando perto do foco do problema, pensei! Havia de fato algo que me arranhava. Me dei conta de que eu tenho raiva da letra i! Mas por quê?

A conclusão veio ligeira: Danyella com ipsilon e dois eles, essa entidade que vos escreve, passou a vida inteira tendo que soletrar o nome. E vendo meu nome ser escrito com i! A cada vez que alguém escrevia Dani, algo me irritava. Eu só não tinha me dado conta disso ainda. Mas o que me irritava mesmo era o y com pingo. Aí era de lascar. Do tipo: a pessoa escrevia com "i", eu corrigia e aí o remendo era puxar uma perna no "i". Ipsilon com pingo. Criava-se aí um novo alfabeto.

Percebi que minha angústia toda era medo do filhote ter que passar a vida explicando o nome. Dizendo que é Filipe com "i". Você está passando por isso agora, sendo um João com til nas Filipinas, terra onde não existe til. E, somente a partir dessa perspectiva, você sugeriu Filipe com "i". Engraçado, né? No fundo eu e você estamos com a mesma preocupação: a dele ser diferente. Eu, preocupada com a diferença aqui. Você, com a diferença no exterior. É...acho que, de um jeito ou de outro, ele vai ter que explicar.

Mais conformada, passei a tarde hoje acarinhando o seu Filipe com "i". E aí que o incômodo foi se dissipando, até que eu achei bonita a combinação com o seu sobrenome: Filipe Schittini. Assim, bem cheio de "is" e pingos e tudo.

Então podemos afirmar:


Habemus Filipe.


P.s.: agora, depois de todo esse redemoinho mental que tive a falta de vergonha de compartilhar com você, vou ali tomar meu gazpacho com soníferos.

Te amo!

Dany com ipsilon, a Louca.







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