sábado, 30 de agosto de 2014

Diário da saudade - Dia 01






Dia 01 - 27/08/14

*Para ler ao som de Mother, John Lennon.

Pela manhã, te ajudei com as malas e os últimos preparativos para a viagem. De tarde fui trabalhar e tentei mergulhar nas demandas de imprensa para não pensar que, dali a algumas horas, eu precisaria me despedir de você. Fomos juntos até o aeroporto. Você falava sobre sua ansiedade e também sobre a coragem necessária para ir até o outro lado do mundo. Eu ouvia tudo do banco do carona, fazia sinal com a cabeça de que sim, você é muito corajoso, e mais corajosos somos nós dois juntos de irmos dar à luz nosso filhote nas Filipinas.

Serão dois meses até irmos te encontrar. Eu pensava nisso o tempo todo, mas evitava verbalizar para não transparecer minha tristeza adiantada. Vamos falar das coisas boas, das novidades que você vai ver, do trabalho, das pessoas, das paisagens! Ah, não adiantou. Você me conhece muito bem. Eu tentei disfarçar o choro enquanto via você tomar o Manhattan mais mal servido da sua vida no bar do aeroporto. Eu e Lipe não podemos beber, você sabe. Então ficamos ali, olhando você, sua ansiedade, sua preocupação em baixar as últimas músicas e carregar o telefone. Eu não podia me mexer direito, porque encostava o pé na tomada e dava mal contato. Você ficava bravo. Eu entendia: não é comigo; ele também está sofrendo, e essa é a maneira dele de botar pra fora. Sempre foi assim, não foi? Eu choro, canceriana que sou. Você explode, tão escorpiano. Aprendi a ter leveza nessa dança.

Tentei disfarçar o choro e tiramos uma última foto juntos antes de você embarcar. Faltavam 15 minutos. Você me beijou com saudade, com tristeza, com amor, com coragem, com sede de pertencermos juntos ao desconhecido. Nos levantamos e seguimos até o seu portão de embarque. Um silêncio cheio de palavras, essas coisas que falamos para encobrir os momentos em que só um abraço bastaria. Caminhamos. É, havia chegado a hora.

Você me disse para eu ficar bem e cuidar do nosso filho. “Cuida do meu filho”: foi exatamente o que você me disse. Você me abraçou e disse que logo estaríamos juntos, que você ia na frente para preparar o terreno para nós e que seríamos, nós três, muito felizes lá. Você pediu que eu prometesse que seríamos felizes. Eu, que quase não gosto de prometer nada, prometi.

Sempre acho que as promessas são um peso, porque o mundo é cheio de mistérios e parece uma prepotência prometer porque nada está totalmente sob o nosso controle.

Mas, ali, percebi: a beleza da promessa não é ter a garantia, mas empenhar todo o nosso desejo para que algo aconteça. Prometer é dizer: no que depender de mim, eu farei tudo para que isso aconteça.

Então prometemos, juntos, que seremos muito felizes em Manila.

Que assim seja, João.

Você respirou fundo, me deu um último beijo, um até daqui a pouco, entregou o bilhete para o rapaz do embarque e seguiu sem olhar pra trás. Quando você dobrou a esquina e saiu do meu campo de visão, não aguentei e chorei tudo o que estava guardado. Eu, a soluçar no aeroporto numa quarta-feira à noite, entre tantas chegadas e partidas. Senti vergonha por estar com o rosto totalmente inchado a esta altura. Aí me lembrei do que a Cristina me diria: deixa vir.

Minha tristeza era tanta naquele momento que virou uma dor física, aquele tal aperto no peito que nos acompanha nessas horas. Em vez de tentar controlar, resolvi me conectar a essa dor e comecei a olhar em volta. Não, não havia só pessoas segurando o choro no aeroporto. Em vários cantos vi pessoas com os olhos cheios de lágrimas. Sentadas num café com os olhos distantes, em pé na fila do estacionamento, ganhando um abraço de algum familiar. Lá estavam elas, as pessoas que ficam, lidando com sua saudade. Um aeroporto é mesmo um lugar peculiar: lá cabe a euforia da chegada e o coração apertado da partida.

E somos, afinal, feitos desses dois extremos. Conhecemos os dois estados, humanos que somos. O bom de sentir a tristeza é saber que ela passa e que a alegria do reencontro há de ser a próxima parada.

Até daqui a pouco, meu amor.

Infinito e além,

Dany

2 comentários:

alice forte disse...

Parabéns. Vc escreve muito bem. Adorei. Esse sentimento é no fundo o mais maravilhoso. . Até vc conhecer o sentimento de ser mãe. Dai sim vc vai se superar. Bjs

Danyella Proença disse...

Oi, Alice! Obrigada pela visita e pelo elogio :) Como você descobriu o blog? Volte sempre por aqui, viu? E, sim, eu imagino que o sentimento de ser mãe deva ser mesmo sublime - a gravidez nos é um belo prelúdio! Grande abraço!

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