sexta-feira, 23 de setembro de 2011
Celebração da língua portuguesa em João Pessoa
Para uma apaixonada pela palavra, pela música do português como eu, estar aqui é um deleite. Ainda mais especial é estar aqui com um filme sobre um poeta.
Acabo de sair da exibição do Braxília, que infelizmente estava vazia. O horário também não favoreceu...o filme foi colocado numa sessão às 16h. Além disso, a projeção foi em dvd, o que perde muito em detalhes e texturas. Mas enfim. Valeu. Gostei um bocado do documentário "Número Zero", de Claudia Nunes, em que ela filmou meninos de rua em Goiânia há cerca de 20 anos e trouxe esse registro. Senti falta de saber como essas crianças estão hoje em dia. Mas isso não é o foco do filme. Penso que a diretora quis mostrar mais o processo delas diante da câmera, que é um elemento estranho na rotina delas. Tenho mais a falar do filme, e de A Dama do Peixoto, o outro doc. da sessão. Mas agora vou correr pra ver Transeunte, do Eryk Rocha. Por um desses acasos fortuitos, me sentei ao lado dele no avião e também do ator do filme, Fernando Bezerra. Ambos queridos e muito gente fina. Vou lá ver o filme pra poder comentar aqui. Hasta!
sexta-feira, 16 de setembro de 2011
o teatro como salto no abismo
Há exatamente um mês, comecei uma nova graduação, agora em Artes Cênicas. As aulas têm sido incríveis, mas estão mobilizando tantos conteúdos em mim que achei pertinente escrever na esperança de que isso ajude a colocar as coisas em perspectiva. Quero mais compartilhar percepções, aqui, do que propriamente teorizar sobre teatro. Mas acaba que as duas coisas se cruzam.
Para uma pessoa cerebral e controladora como eu, as aulas de Cênicas têm sido um verdadeiro salto no abismo. Desconstrução total de mim, casa de espelhos de todas as minhas fraquezas e limitações, a própria coragem de pertencer ao desconhecido sentida no corpo, e não no papel. Entrar numa empreitada como essa é sem dúvidas um ato de coragem. O que me faz perceber que todo ator de verdade é um ser corajoso. Não é possível atuar sem se lançar a um processo indefinido, que vai ganhando contornos somente na medida em que acontece.
Já passei por uma graduação em Jornalismo e um mestrado em Cinema. E posso dizer, sem dúvidas, que a experiência em Artes Cênicas tem sido a mais profunda, no sentido de nos forçar a sentir tudo na nossa própria experiência. Não é como ver um filme e pensar diversas relações. É claro que o cinema permite entrar com contato com coisas profundas, mas sempre podemos contar com a proteção do cerebral no processo. No teatro, não. Se você se protege, não faz determinada cena. Fica lá patetando, pensando e travando todo o resto. E é exatamente assim que eu tenho me sentido em muitas aulas. Acabei trancando as disciplinas que me eram mais cômodas, que me permitiam buscar algumas defesas, e fiquei apenas nas que me tiram do eixo: Corpo e Movimento e Interpretação Teatral.
Algumas aulas funcionam como verdadeiras sessões de terapia. Porque eu, desde sempre, tenho que lutar com minha necessidade de controle. Minha ansiedade generalizada vem muito daí. No novo curso, você chega à maioria das aulas sem saber qual é o exercício. E só descobre como seu corpo reage lá, na prática, experimentando. Acho que a noção de ensaio vem muito disso: experimentar. Tudo pode sair desse processo. Mas o caminho é denso, cheio de zonas de sombra. Você entra em contato com o pior e o melhor de você. É uma desconstrução.
Começo a me perguntar: que corpo era esse, automático, que eu trouxe até aqui? Será que é possível destravar todas as defesas nessa altura da vida? Sim, porque eu sou cheia de defesas. Meu maxilar, por exemplo, é travado. Sofro com dores horríveis que irradiam para a musculatura do pescoço e para a cabeça. O dentista diz que é bruxismo e apertamento dos dentes, o que cansa a musculatura. Mas essa é a ponta do iceberg. O que me faz apertar os dentes até essa dor é a minha ansiedade, minha necessidade de controle. Aí como faz num curso em que você tem que soltar todas as suas articulações? Num curso em que você tem que relaxar e confiar no outro? Confiar. Essa é outra palavra chave no teatro, pelo que tenho percebido. Atuar é oferendar-se. Teatro é oferenda.
Todos esses caminhos são novidade pra mim. Trabalho diariamente com jornalismo, que é perfeito para pessoas cerebrais se protegerem. Você pode ficar o tempo todo na persona do "estou seguro". Bom mesmo parece ser quem tem o domínio da situação. É quem faz a pergunta certeira. Se você não usa essa máscara, é difícil te levarem a sério. No teatro, enquanto você está se preparando, tem que se permitir esvaziar tudo o que você é para poder virar uma outra coisa. Esvaziar tudo quer dizer entrar em contato com os pontos em que você tem menos controle, em que você realmente começa do zero. É não ter o domínio de nada para ter o domínio de tudo.
Diante disso, posso dizer que estou em plena crise: descobrindo que não sei respirar, não sei andar, sou acelerada, não consigo perceber onde distribuo os pesos, fico racionalizando no meio do movimento e por aí vai. Mas persisto. De peito aberto tomando quantas flechadas vierem.
É difícil ver nossas fragilidades assim tão expostas. Mas o processo me faz pensar que uma outra consciência de mim é possível. Algo novo vai se construir. E vai um dia voltar a quebrar-se. Até o infinito da vida, feita de constantes reconstruções.
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