Cheguei em casa outro dia e minha mãe estava assistindo a um filme no Canal Brasil. O visual anos 80 me chamou a atenção e eu resolvi sentar pra ver do que se tratava: Garota Dourada, dirigido pelo Antônio Calmon. Logo nas primeiras cenas apareceu o Sérgio Mallandro como um rock star, figurino meio Elvis. Eis que o seguinte diálogo surreal se trava:
Mãe: Ué, o Sérgio Mallandro era cantor também?
Eu: Acho que era...ele cantava aquela música do capeta em forma de guri.
Mãe: Ah, tá. Achei que ele fosse só malandro mesmo.
Eu: Como assim?
Mãe: Ele não era palhaço, minha filha? Só lembro dele fazendo aquelas malandragens...
Malandragem=glu glu?
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
Contradições de uma cidade nova I - O Galinho
Quem mora em Brasília deve estar acompanhando, há um tempo, a polêmica em torno do desfile (ou não) do Galinho. Para os que não sabem que diabo de galo é esse que desfila, trata-se do Galinho de Brasília, versão local do Galo da Madrugada, de Recife. Trocando em miúdos: um bloco de frevo que pulsa, desde que eu me entendo por gente, na comercial da 203/204 Sul. Desde criança eu vou lá com minha mãe brincar carnaval. Lembro como hoje a minha primeira sombrinha de frevo, o encantamento diante das passistas, a camiseta azul com o desenho do Galinho de 1995, que até hoje resiste no fundo de uma gaveta...lembro-me de quando a gente saia da frevança e subia para o Pizzaiolo, para comer no fim da noite. Isso quando o Pizzaiolo ainda era uma pizzaria meio boteco ali na esquina da 312. Pois. Eu ficava do lado de fora, tentando lembrar de cabeça como as passistas dançavam. Ficava ali, insistentemente tentando fazer uma tesoura. Até que eu consegui.
Anos depois, já adulta, resolvi correr atrás dessas imagens de infância e fui fazer aula de frevo. A primeira aula foi fantástica: era como se eu já soubesse fazer os passos, como se o registro deles já morasse em mim de alguma forma. Coisas que talvez seu Jung explique. É forte isso pra mim porque eu sempre fui muito indisciplinada em questões de esporte. Já tentei natação, basquete, jazz, dança do ventre, ritmos, hidroginástica, kung fu, tai chi, etc, etc. E o frevo, quem diria, foi o único em que eu fiquei. Fiquei porque ele já estava em mim, sempre esteve, acredito muito nisso. Já são mais de cinco anos frevando. Não sou nenhuma passista pernambucana, vá lá, mas o que importa é que, quando danço, eu me sinto 100% conectada com alguma coisa muito forte e antiga, talvez aquilo que chamamos alma (continua...)
Anos depois, já adulta, resolvi correr atrás dessas imagens de infância e fui fazer aula de frevo. A primeira aula foi fantástica: era como se eu já soubesse fazer os passos, como se o registro deles já morasse em mim de alguma forma. Coisas que talvez seu Jung explique. É forte isso pra mim porque eu sempre fui muito indisciplinada em questões de esporte. Já tentei natação, basquete, jazz, dança do ventre, ritmos, hidroginástica, kung fu, tai chi, etc, etc. E o frevo, quem diria, foi o único em que eu fiquei. Fiquei porque ele já estava em mim, sempre esteve, acredito muito nisso. Já são mais de cinco anos frevando. Não sou nenhuma passista pernambucana, vá lá, mas o que importa é que, quando danço, eu me sinto 100% conectada com alguma coisa muito forte e antiga, talvez aquilo que chamamos alma (continua...)
Contradições de uma cidade nova I - O Galinho
Ano passado, saí para frevar no Galinho, como de costume. Pra minha surpresa, quando estava voltando pra casa, passei por uma confusão entre policiais e foliões na 203/204. Com tiro, fumaça, garrafas quebradas, helicópteros e tudo. Parecia cena de guerra. Tudo porque, depois de um certo horário, os moradores da quadra exigiram que os foliões que insistiam em ficar lá depois da saída do Galo fossem embora. Eles não quiseram ir, a polícia usou métodos que a gente conhece, o povo retrucou com métodos que a gente também conhece, e aí já viu.
Esse ano, os moradores encasquetaram que o Galinho não poderia passar por lá de jeito nenhum. Disseram que incita a baderna. Depois de muita negociação e do Galinho ameaçar não desfilar em protesto, chegou-se a um acordo: o Galinho vai se concentrar em outro canto, mas poderá passar pela quadra (em intervalo não superior a 1 hora, cronometrado) e terão que cumprir uma série de exigências da vizinhança. Li hoje no Correio a argumentação de um morador, que dá sinais dessas exigências:
"Não queremos ambulantes, casais e conversas debaixo dos blocos, nem que foliões possam estacionar nas quadras. E se eles não respeitarem o tempo de passagem, o bloco não poderá passar nunca mais por aqui".
Eu fico triste toda vez em que escuto autoritarismos como esse. Triste mesmo, de coração cortado com o que querem fazer de Brasília. A cidade é nova e luta para manter suas poucas tradições culturais construídas por aqueles que se identificam com a cidade, que se sentem brasilienses. Como eu, filha de uma baiana com um paulista. Minha mãe sempre me levou para o Beirute, para o Psiu, para o Arabesque. Sei o que é comer pastel com caldo de cana na rodoviária, o que significa uma prosaica pizza "sabor único" da Dom Bosco. Entendo, intuitivamente desde criança, o simbolismo da passagem do Galinho pela superquadra - para quem não mora aqui, há mini-subidas na tesourinha que fazem o folião se sentir nas ladeiras de Olinda...
Mas que valor têm todas essas coisas para uma pessoa que dá uma declaração como aquela ali de cima? Nenhum. Deve ser uma pessoa que se sinta muito à vontade morando num caixote numa cidade cartesiana, de siglas e números, com a ordem intacta. A essa pessoa, eu digo: a cidade não pode ser só isso!!! O que torna uma cidade única é a vida que pulsa de suas ruas, de seus foliões, de sua desordem. Brasília precisa se abrir para isso. Precisamos sim de pontos de encontro arborizados, de coretos em que múltiplos olhares possam brincar juntos, e não de uma Praça da Soberania com museu dos presidentes e estrutura de concreto, morta, no meio da Esplanada. Precisamos do Galinho de Brasília e das cores que resistem aqui no carnaval, já tão sem graça.
Para essa pessoa que deu essa infeliz declaração, eu dou me testemunho: moro em frente ao Libanus, um bar muito movimentado da cidade. Todos os dias, roubam as vagas do meu prédio e eu tenho que estacionar longe e andar, mesmo cansada do trabalho. À noite, muita gente passa conversando alto, gritando, falando besteira. Ah, Sr. Morador da 203, com certeza casais já ficaram embaixo do bloco e já treparam no estacionamento. Muita gente também já fez xixi por ali depois de beber. Isso acontece todos os dias. Muitas vezes eu maldigo os freqüentadores do Libanus, praguejo, xingo, peço para fazerem silêncio. Já passei muita raiva. Mas entendo que faz parte da dinâmica da cidade. Ou será que eu devo exigir um Termo de Ajustamento de Conduta? Devo procurar o Ministério Público, como vocês querem fazer, porque as pessoas conversam embaixo do meu bloco e podem estacionar na minha quadra? Aliás, o senhor me deu uma ideia: podiam fechar a minha quadra para os bebuns de fim de semana! Malditos bebuns!!
Seria tão sensato se todos os moradores de todas as quadras com bares resolvessem fazer isso, não? Acho que ficaria perfeito, aliás. Lei seca, bares fechando à meia-noite (isso se não começarem a te expulsar antes), pardais espalhados a cada 100m, praça de concreto na Esplanada e um Galinho silenciado. Eu prefiro uma cidade que respire. Aos que preferem o panóptico do Foucault, só me resta desejar um pouco de vida.
Esse ano, os moradores encasquetaram que o Galinho não poderia passar por lá de jeito nenhum. Disseram que incita a baderna. Depois de muita negociação e do Galinho ameaçar não desfilar em protesto, chegou-se a um acordo: o Galinho vai se concentrar em outro canto, mas poderá passar pela quadra (em intervalo não superior a 1 hora, cronometrado) e terão que cumprir uma série de exigências da vizinhança. Li hoje no Correio a argumentação de um morador, que dá sinais dessas exigências:
"Não queremos ambulantes, casais e conversas debaixo dos blocos, nem que foliões possam estacionar nas quadras. E se eles não respeitarem o tempo de passagem, o bloco não poderá passar nunca mais por aqui".
Eu fico triste toda vez em que escuto autoritarismos como esse. Triste mesmo, de coração cortado com o que querem fazer de Brasília. A cidade é nova e luta para manter suas poucas tradições culturais construídas por aqueles que se identificam com a cidade, que se sentem brasilienses. Como eu, filha de uma baiana com um paulista. Minha mãe sempre me levou para o Beirute, para o Psiu, para o Arabesque. Sei o que é comer pastel com caldo de cana na rodoviária, o que significa uma prosaica pizza "sabor único" da Dom Bosco. Entendo, intuitivamente desde criança, o simbolismo da passagem do Galinho pela superquadra - para quem não mora aqui, há mini-subidas na tesourinha que fazem o folião se sentir nas ladeiras de Olinda...
Mas que valor têm todas essas coisas para uma pessoa que dá uma declaração como aquela ali de cima? Nenhum. Deve ser uma pessoa que se sinta muito à vontade morando num caixote numa cidade cartesiana, de siglas e números, com a ordem intacta. A essa pessoa, eu digo: a cidade não pode ser só isso!!! O que torna uma cidade única é a vida que pulsa de suas ruas, de seus foliões, de sua desordem. Brasília precisa se abrir para isso. Precisamos sim de pontos de encontro arborizados, de coretos em que múltiplos olhares possam brincar juntos, e não de uma Praça da Soberania com museu dos presidentes e estrutura de concreto, morta, no meio da Esplanada. Precisamos do Galinho de Brasília e das cores que resistem aqui no carnaval, já tão sem graça.
Para essa pessoa que deu essa infeliz declaração, eu dou me testemunho: moro em frente ao Libanus, um bar muito movimentado da cidade. Todos os dias, roubam as vagas do meu prédio e eu tenho que estacionar longe e andar, mesmo cansada do trabalho. À noite, muita gente passa conversando alto, gritando, falando besteira. Ah, Sr. Morador da 203, com certeza casais já ficaram embaixo do bloco e já treparam no estacionamento. Muita gente também já fez xixi por ali depois de beber. Isso acontece todos os dias. Muitas vezes eu maldigo os freqüentadores do Libanus, praguejo, xingo, peço para fazerem silêncio. Já passei muita raiva. Mas entendo que faz parte da dinâmica da cidade. Ou será que eu devo exigir um Termo de Ajustamento de Conduta? Devo procurar o Ministério Público, como vocês querem fazer, porque as pessoas conversam embaixo do meu bloco e podem estacionar na minha quadra? Aliás, o senhor me deu uma ideia: podiam fechar a minha quadra para os bebuns de fim de semana! Malditos bebuns!!
Seria tão sensato se todos os moradores de todas as quadras com bares resolvessem fazer isso, não? Acho que ficaria perfeito, aliás. Lei seca, bares fechando à meia-noite (isso se não começarem a te expulsar antes), pardais espalhados a cada 100m, praça de concreto na Esplanada e um Galinho silenciado. Eu prefiro uma cidade que respire. Aos que preferem o panóptico do Foucault, só me resta desejar um pouco de vida.
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