Os ciganos fazem parte do meu imaginário desde sempre – tenho recordações deles passando na minha rua, no Guará; do parque de diversões montado por eles em Posse (GO); da mistura de fascínio e medo diante das histórias de que eles “roubavam menino”. Acho que, de certa forma, eles fazem parte do meu olhar. Tanto que eu me descrevo no Facebook como “zingarina” – a incrível personagem da Asia Argento em Transylvania, cujo nome quer dizer “ciganinha”.
Hoje, conversando com a minha mãe, tive um entendimento muito forte sobre a origem desse universo. Ela me disse que tinha verdadeira fascinação pelos ciganos quando era criança, em Canápolis, na Bahia. Disse que queria ser cigana e que dizia para todo mundo que era filha de ciganos que tinha sido “dada” pra família dela.
Fiquei arrepiada quando ela me contou essa história, porque era uma fascinação que nós nunca compartilhamos conscientemente – nunca se falou sobre isso em minha casa. Fico sempre impressionada com o poder do não-dito, daquelas referências transpessoais que nós captamos via alma, via gestos e memórias. Minha mãe me disse que gostava de brincar perto do acampamento dos ciganos e ficava olhando como eles eram bonitos e como gostavam de dançar!
Fiquei pensando em todas essas relações transmitidas em silêncio. Minha mãe se criou no sertão da Bahia, próxima ao Rio São Francisco. Eu sou apaixonada por rios. Meu tio Manoel, quando fez sua passagem, teve no retrato distribuído à família sua imagem contemplando o Velho Chico. Atrás, a letra de Caetano: “Onde eu nasci passa um rio”. Foi a forma como os filhos, esposa e netos encontraram para eternizá-lo, a síntese de todo seu afeto e infinitude.
Pensando em Tio Manoel, na conversa com minha mãe e na minha conexão com o cosmos ao passear pelas águas da Amazônia nesse fim de semana, entendi aí do que somos feitos, o que une nossa família: a liberdade e a leveza das águas.
O rio e o mundo dos ciganos são do tamanho do nosso coração.
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